29 maio, 2011

Gil Scott-Heron


A morte de Gil Scott-Heron (GSH) tem um significado duplo.

Por um lado, marca a partida de um dos últimos ícones negros da soul e da spoken word norte-americana, cujo feliz “The revolution will not be televised” - hoje um autêntico adágio planetário - demonstra a dimensão profundamente social e política da carreira de GSH.

Por outro lado, ainda, a partida GSH acontece num momento em que a sua carreira ameaçava ressurgir, para o bem de todos nós. Depois de um álbum fenomenal como I'm New Here, disco de balanço (ainda que um disco “de regresso”), GSH voltou a ter o mundo aos seus pés, 16 anos depois do seu último registo.
Repescado pelos produtores jovens que estão a dar cartas, mais inseridos na cena actual (seus gostos e tendências), GSH conseguiu fazer um disco moderno (se GSH não fosse o histórico que é, talvez qualificassem o seu disco de “trip-hop” ou “down-tempo”) , arrojado mesmo (logo na abertura do disco ouvimos GSH a declamar sobre a “Flashing Lights”, de Kanye West), sem deixar de ser ele próprio: a voz pausada, profunda e com o seu quê de revolucionário de sempre. Na verdade, I’m New Here foi produzido por Richard Russell, o patrão da XL Recordings, que conseguiu fazer com GSH um disco que não deixará de agradar aos seus seguidores mais antigos (lá está, a voz e o estilo estão aí, sem tirar nem pôr), e que, mais importante, atraiu gerações mais novas, para quem GSH era um nome pouco mais do que desconhecido. I’m New Here, disco soturno, reflexivo, de melodias esconsas e beats (beats mesmo!) minimalistas, era um ponto de viragem na carreira de GSH. Podia muito bem significar o regresso do americano aos seus melhores momentos. A dúvida ficará sempre no ar. Enquanto isso, resta-nos relembrar, aos que foram, o sóbrio mas belíssimo concerto que este senhor deu na Casa da Música, dia 15 de Maio de 2010.
Pessoalmente, ficou-me a imagem de um homem um tanto gasto pelo tempo (e pelas drogas...), ainda que ao mesmo tempo bem humorado e um verdadeiro gentleman. Mas os seus olhos pequeninos denunciavam algum cansaço, próprio de quem já viveu muitas lutas em tempos outros, tempos de causas e acções. Próprio de quem, enfim, é, de facto, novo aqui, neste século XXI. Ainda assim, e esta é a melhor imagem que guardo daquela noite, GSH parecia um avô ternurento que todos queríamos ter quando se sentou ao piano e nos contou uma história. Chamava-se “Winter in América”:





I'm New Here foi considerado aqui, por nós dois, como o melhor disco de 2010.

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